terça-feira, 5 de abril de 2011

O QUE É A PSICOPEDAGOGIA?

I . INTRODUÇÃO

" O pior dano que se pode fazer a uma criança é levá-la a perder a confiança em sua própria capacidade de pensar ".
(Emilia Ferreiro)





Algumas definições encontradas entre os estudiosos da psicopedagogia que foram o ponto de partida para a elaboração e reflexão do conteúdo deste trabalho.
Definições
GOLBERT - (...) o objeto de estudo da psicopedagogia deve ser entendido a partir de dois enfoques: preventivo e terapêutica. O enfoque preventivo considera o objeto de estudo da psicopedagogia a ser humano em desenvolvimento, enquanto educável. Seu objeto de estudo é a pessoa a ser educada, seus processos de desenvolvimento e as alterações de tais processos. Focaliza as possibilidades do aprender, num sentindo amplo.Não deve se restringir a uma só agência como a escola, mas ir também à família e à comunidade. Poderá esclarecer, de forma mais ou menos sistemática, a professores, pais e administradores sobre as características das diferentes etapas do desenvolvimento, sobre o progresso nos processos de aprendizagem, sobre as condições psicodinâmicas da aprendizagem. O enfoque terapêutica considera o objeto de estudo da psicopedagogia a identificação. análise, elaboração de uma metodologia de diagnóstico e tratamento das dificuldades de aprendizagem (1985, p. 13)

KIGUEL - o objeto central de estudo da psicopedagogia está se estruturando em torno do processo de aprendizagem humana: seus padrões evolutivos normais e patológicos - bem como a influência do meio (família, escola e sociedade) no seu desenvolvimento.

NEVES - a psicopedagogia estuda o ato de aprender e ensinar. levando sempre em conta as realidades internas e externas da aprendizagem, tomadas em conjunto. E mais procurando estudar a construção do conhecimento em toda a sua complexidade, procurando colocar em pé de igualdade os aspectos cognitivos. afetivos e sociais que lhe esteio implícitos (1991, p. 12).

RUBINSTEIN - num primeiro momento a psicopedagogia esteve voltada para a busca e o desenvolvimento de metodologias que melhor atendessem aos portadores de dificuldades, tendo como objetivo fazer a reeducação ou a remediação e desta forma promover o desaparecimento do sintoma. E ainda, a partir do momento em que o foco de atenção passa a ser a compreensão do processo de aprendizagem e a relação que a aprendiz estabelece com a mesma. o objeto da psicopedagogia passa a ser mais abrangente: a metodologia é apenas um aspecto no processo terapêutico. e o principal objetivo é a investigação de etiologia da dificuldade de aprendizagem. bem como a compreensão do processamento da aprendizagem considerando todas as variáveis que intervêm neste processo. (1992, p. 103)
SCOZ - estuda o processo de aprendizagem e suas dificuldades. e numa ação profissional deve englobar vários campos do conhecimento. integrando-os e sintetizando-os.
VISCA - inicialmente foi uma ação subsidiária da Medicina e da Psicologia, perfilou-se como um conhecimento independente e complementa, possuída de um objeto de estudo - o processo de aprendizagem - e de recursos diagnósticos, corretores e preventiivos próprios.
WEIS ¬ busca a melhoria das relações com a aprendizagem, assim como a melhor qualidade na construção da própria aprendizagem de alunos e educadores.

MAS AFINAL O QUE É E POR QUÊ SURGIU A
PSICOPEDAGOGIA?
Há anos o sistema educacional permanece o mesmo, mas há mais ou menos 20 anos apareceu um novo campo de estudo chamado psicopedagogia. Por quê? Fazendo uma análise da vida familiar vemos que sua estrutura se modificou bastante e talvez de uma forma um pouco abrupta. Sabemos que a toda ação corresponde uma reação e qual é o ponto mais fraco em uma família? Claro as crianças. Somando-se esta mudança às mudanças tecnológicas que vem ocorrendo, observamos um aumento de adrenalina muito grande na medida em que parecemos estar sempre desatualizados no mundo de hoje. A cada dia novas invenções e soluções aparecem para tomar obsoletas aquelas que acabamos de aprender. Sem dúvida, apesar destas mudanças não terem ocorrido dentro do sistema. educacional, pelo menos aqui no Brasil as mudanças neste sistema vem acontecendo aos poucos e talvez de uns cinco anos para cá, elas afetam diretamente os nossos alunos, pois como veremos acontecer um aumento no fracasso escolar. conseguiam solucionar a contento estes. As ciências existentes não conseguiam solucionar a contento estes.
E a partir de então que nasce a psicopedagogia, sem estar ainda totalmente estruturada ou definida. Nasce da necessidade de solucionar problemas que não recebiam respostas positivas nos métodos tradicionais utilizados. A lacuna que estava aberta é então preenchida e o processo da aprendizagem escolar passa a ser alvo de um novo campo de estudo, a psicopedagogia.
Este trabalho vem tentar clarificar de uma forma bastante objetiva o que é a psicopedagogia e seu objeto de estudo, uma vez que as definições apresentadas acima não nos satisfizeram plenamente.

II. HISTÓRIA
No Brasil, a prática da psicopedagogia surgiu da necessidade de contribuir na questão do fracasso escolar apresentando um caráter reeducativo, assumindo ao longo do tempo um enfoque terapêutico.
Até os anos 80, a psicopedagogia tratava os sintomas apresentados pelos alunos com problemas de aprendizagem, cabia a ela remediar as dificuldade no intuito de levar o sujeito ao domínio dos conteúdos e habilidades escolares. Nesta época ainda não possuía um corpo teórico próprio.
Entre os anos 80 e 90, seu objeto de estudo passa ser o processo de aprendizagem e a preocupação em refazê-Io, uma vez que baseando-se nos trabalhos de Piaget foi possível uma melhor compreensão da estrutura e funcionamento do sujeito e a sua relação com o meio. Dando ênfase aos aspectos cognitivo, afetivo e social. Já nestes anos apresenta conceitos próprios.
Na década atual a psicopedagogia passa ser vista como uma ciência independente da psicologia e da pedagogia. Ela não é apenas a união ou interseção destas duas. Agora ela possui o seu objeto de estudo definido e com um objetivo maior. A psicopedagogia, atualmente, não se focaliza mais nos sintomas ou processo de aprendizagem para o seu
estudo, o protagonista passa a ser o ser que aprende aquele que interage com o mundo, que também apresenta o seu lado afetivo e cognitivo. Nasce, então, o SER COGNOSCENTE, aquele que será estudado e trabalhado pela psicopedagogia para que possa construir o seu conhecimento adquirindo uma autonomia e conseqüentemente uma ousadia, visando o seu crescimento. Não podemos esquecer jamais que ao mesmo tempo que o ser cognoscente possui uma integridade é também um ser múltiplo. A relação psicopedagógica se dá, portanto, entre o psicopedagogo e o ser cognoscente; ou seja, o sujeito que aprende inserido num meio ensinante.

III. A PSICOPEDAGOGIA
Dar uma definição a palavra psicopedagogia foi um trabalho árduo, pois quanto mais líamos mais complexa se tomava a sua definição. Isto porque ainda é um campo em processo de cOnstrução. Se pegarmos a definição que está no Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa o termo psicopedagogia é definido como "aplicação da psicologia experimental à pedagogia"(1992 p. VII). Na verdade a psicopedagogia é muito mais que isso pois possui um caráter interdisciplinar. Entenda-se por interdisciplinar a definição que Barker deu em o Rumo da Língua: "0 interdisciplinar, de que tanto se fala não está em confrontar disciplinas já constituídas das quais, na realidade nenhuma consente em abandonar-se. Para se fazer interdisciplinariedade, não basta tomar um "assunto " (um tema) e convocar em torno duas ou três ciências. A interdisciplinariedade consiste em criar um novo objeto novo que não pertença a ninguém (1988, p. 99).
Tendo por base esta definição podemos entender a psicopedagogia como a constituição de uma nova área que recorre aos conhecimentos da psicologia, da pedagogia, psicanálise, lingüística, fonoaudiologia em medicina, traçando o seu próprio objeto de estudo a partir de um corpo teórico próprio.
A psicopedagogia trabalha com a aprendizagem e por isso baseia-se na visão de Piaget que não considera a inteligência como algo inato, nem adquirido, mas sim o resultado de uma construção de vida à interação das pré condições do sujeito e às circunstâncias do meio social. Junta-se isto o lado afetivo tão bem desenvolvido por Freud ao estudar o inconsciente, ajudando-nos a elucidar como o ser funciona como um todo e não apenas como um gravador que registra o que acontece. O ser interage com o meio e utilizando seu lado afetivo e cognitivo constrói então o seu próprio conhecimento.
Nos perguntamos então o que é que a psicopedagogia traz de novo, uma vez que ela se utiliza de conhecimentos já existentes e porque o seu resultado é tão positivo. A resposta já está na própria pergunta. Justamente por se utilizar de vários conceitos já conhecidos e fazer com que eles interajam. A psicopedagogia conseguiu analisar o seu objeto de estudo com mais clareza e mais fidelidade uma vez que se preocupa em analisar toda as faces que o ser cognoscente apresenta.
Outro lado positivo é conseguir conciliar tão bem duas ciências aparentemente, opostas pelo abstrato e pelo concreto. como a psicanálise e a psicologia genética. Ao considerar todo o estudo de Piaget preocupado com a construção do conhecimento, como este se dá através dos limites que as fases apresentadas por Período Sensório-Motor, Pré Operacional, Operacional Concreto e Operacional Formal nos instrumentalizamos para analisar a dimensão racional deste ser. Junta-se a isto a teoria de Freud do inconsciente que nos elucida tão bem os mecanismos de defesa do Ego que podem se refletir em bloqueio de aprendizagem do ser cognoscente, e os nossos impulsos, desejos e paixão, teremos a dimensão desiderativa dando-nos, então uma visão mais complexa deste ser.
E um campo de estudo que dá certo pois prioriza a muItiplicidade deste ser que aprende. Nesta multiplicidade não podemos esquecer o vínculo que se encontrará na dimensão relacional, uma vez que sem ele é dificil estabelecer um campo onde possa haver a aprendizagem. E é neste vínculo também que se encontra o sucesso da psicopedagogia, pois é através do vínculo estabelecido entre o psicopedagogo e o ser cognoscente que haverá então a abertura para que o processo comece e que passamos levar o nosso "paciente" para o caminho que ele procura, ou seja, a sua autonomia, a sua confiança e segurança para poder aprender e crescer, pois este ser estará sempre se confrontando com o processo dialético no qual vivemos equilíbrio e desequilíbrio, erro e acerto, prazer e negação construção e "desconstrução" e por isso mesmo é importante também que despertemos nele a semente do filósofo que existe em cada de nós para que o olhar do ser sobre o mundo se torne mais frutífero.

IV. O SER COGNOSCENTE
Se faz necessário conhecer um pouco melhor este objeto de estudo da psicopedagogia que é o ser cognoscente.
Quem é o ser o ser cognoscente? É aquele que aprende. Mas aquele que aprende não é apenas- o aluno que sai de casa como o seu material e uniforme com dever de casa pronto e vai para a escola para adquirir novos conhecimentos. O ser que aprende é o todo e não apenas o cognitivo e é aí que a psicopedagogia conseguiu desatar o nó que havia no momento em que o processo de aprendizagem não se dava da forma desejada ou esperada.
Este ser é formado por 3 dimensões das quais já falamos e reforçaremos aqui para clarificá-las. Usaremos um esquema já bastante conhecido pelos psicopedagogos para representar este ser.

DIMENSÃO RELACIONAL
O ser cognoscente aprende na interação com o meio e com os outros construindo sua identidade para alcançar o conhecimento e a autonomia.
Sendo um ser contextualizado e determinado por suas condições biológicas ele interage de maneira particular, estabelecendo vínculos. Essas relações vinculares positivas ou negativas são marcadas por relações anteriores e representativas e por isso mesmo podem ser resgatadas.

DIMENSÃO COGNITIVA
A área cognitiva se refere a construção do conhecimento. Aqui nos basearemos nos estudos de Piaget. o ser constrói o seu conhecimento através de etapas que se tomam mais complexas e cada etapa posterior conterá dentro dela as anteriores. Para isso é preciso haver a interação do sujeito com o objeto pois é ai que se dá o conhecimento. Através da assimilação e posterior acomodação onde haverá então a transformação do ser, pois para Piaget a inteligência se dá na capacidade de adaptação.

DIMENSÃO AFETIVA
Todo evento psíquico é determinado por aqueles que o precederam, os acontecimentos na vida mental do sujeito podem ser furtuitivos ou não relacionadas com os que procederam, sugerindo serem apenas na aparência. Cada um destes eventos tem um significado e um significante.
O sujeito não tem autonomia de suas próprias pensamentos, o inconsciente e a própria essência da sua vida mental, sendo instituindo por moções do desejo, regido pelos princípios da realidade e do prazer.
A dimensão afetiva se articula às demais dimensões numa totalidade dinâmica gerando uma ação que organiza e modifica o meio, que termina na construção do conhecimento e do próprio sujeito cognoscente.
O nosso objeto de estudo é este ser que possui estas 3 dimensões e que por isto está sujeito a mudanças de comportamento que não eram entendidas quando apenas se concentrava-se na dimensão cognitiva ou afetiva, poucas vezes a relacional então era considerada.
É preciso estar atendo ao processo dinâmico que há na construção do conhecimento deste ser uma vez que ele influência o meio e por ele é influenciado. É muito importante lembrar que é no desequilíbrio que se faz possível a construção do conhecimento e por isso é importante estar sempre desafiando este ser para que ele possa dar um passo a frente e se sentir motivado para satisfazer a ansiedade que a falta de conhecimento nos traz, tornando¬o confiante e seguro.
Uma vez que se considera as 3 dimensões do ser é bom lembrar que a atividade criadora é uma característica importante para ele, pois ele construirá este conhecimento de uma forma onde estarão organizados os seguintes passos: perceber, discriminar, organizar, conceber, conceituar e enunciar. Temos que lembrar que este processo acontece de uma forma integrada. O que importa é que a ação sempre segue este processo o que muda é a qualidade uma vez que esta está diretamente ligada às fases de Piaget. Portanto, a qualidade do resultado deste processo será definida pela fase em que o ser cognoscente se encontra.

V. A ATUAÇÃO DA PSICOPEDAGOGIA
A existência da psicopedagogia parte da demanda dos problemas de aprendizagem. Por isso, a necessidade de estudar os "processo de aprendizagem". A partir deste estudo, podemos perceber a psicopedagogia como em muitas outras áreas, atuação preventiva e clínica.
Na função preventiva se objeto de estudo é o ser humano em desenvolvimento enquanto educável. Isso é, ela atua de forma ampla tanto na escola, como na família quanto na comunidade. A psicopedagogia esclarece sobre as etapas da evolução ligada aos processo de aprendizagem e as condições determinantes destas dificuldades.
No trabalha terapêutico a função da psicopedagogia é dirigida ao sujeito que aprende, como ele aprende e porquê ele aprende, além de perceber a dimensão da relação entre o psicopedagogo e sujeito de forma a favorecer a aprendizagem.
Como profissional, o psicopedagogo pode atuar em uma perspectiva preventiva ou em uma abordagem terapêutica, clínica seu trabalho pode estar ligado a uma instituição ou ser estritamente individual (em seu próprio consultório).
É bastante expressivo o número de alunos que apresenta dificuldade de ler, de ortografar, de escrever e mesmo de pensar, exigindo uma abordagem terapêutica. Dando a esse fato, fica implícito a necessidade de ação preventiva do psicopedagogo. Ocupando-se da integração do aluno na vida escolar, o psicopedagogo, é capaz de colaborar para que o aprendente estabeleça com o ato de aprender uma relação prazerosa e desafiadora.
O psicopedagogo deverá ser um profissional sensível, com domínio teórico buscando uma permanente atualização e equilíbrio emocional. Ter percepção crítica, inclusive para reconhecer os limites de sua atuação. Saber executar, acolher e ver o sujeito com um olhar para além de, valorizando a autonomia já construída resgatando o desejo de aprender e os vínculos positivos.

VI. CONCLUSÃO
Concluir um trabalho sobre o que é a psicopedagogia nos parece tarefa não muito fácil, uma vez que pensamos ser possível que esta definição que estabelecemos em nosso trabalho ainda não será a definitiva.
Já que o processo de aprendizagem se dá no desequilíbrio, talvez seja frutifico para a psicopedagogia que esta não se equilibre jamais, uma vez que a vida nos apresenta sempre situações nova, e que ela própria já mudou seu objeto de estudo por 3 vezes.
O que importa, no entanto, é que fique claro, para nós futuros psicopedagogos, que o vínculo estabelecido com o nosso cliente que é constituído por 3 dimensões e possui um ECRO (redundante falando que é só dele) e que irá interagir com o nosso ECRO, seja o caminho para toma este EU COGNOSCENTE autônomo e criativo para agir e mudar o. seu meio, sendo também mudado por ele, mas estando seguro de que este processo só o fortificará.
É por último, mas não menos importante, que possamos determinar o lugar exato da psicopedagogia no mundo atual e não deixar que ela seja considerada a panacéia para os problemas de aprendizagem, uma vez que sabemos que é preciso ter a humildade de reconhecer que nem tudo dependerá de nós.
"O termo psicopedagogia apresenta-se hoje, como uma característica especial. Quanto mais tentamos, elucidá-lo, menos claro ele nos aparece. (Bossa - 1994)

VII. BIBLIOGRAFIA

1. ALMEIDA E SILVA M. C. - Em busca de uma Fundação para a Psicopedagogia,
Rio de Janeiro PUC-RIO, Tese de Mestrado, 1992.
2. BOSSA NADIA A. - A Psicopedagogia no Brasil: Constituições a partir da Prática,
porto Alegre, 1994.
3. KIGUEL, S.M. - Abordagem Psicopedagogia da Aprendizagem
4. LAJONQUIERE, L - De Piaget a Freud para repensar as aprendizagens, 1992.
5. MAMEDE NEVES, M.A. - Psicopedagogia: Um só termos e muitas significações ¬
Revista da ABBPp, São Paulo [21] V. 10, 10 Semestre, 1991 (1987)
6. PICHON-RIVIERE E. - Teoria do vínculo, 1991
7. SCOZ, B - Psicopedagogia e Realidade Escolar, 1994.
8. VISCA, A - Psicopedagogia: Novas Contribuições, 1991






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Um comentário:

  1. Boa noite, quem é a autora desse conteúdo? para colocar nas referências de um trabalho?

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